Como dar aula de incompetência
Página 1 de 1
Como dar aula de incompetência
Imagine se, num passe de mágica, multiplicássemos por dez a renda per capita do brasileiro.
Resultado: teríamos a cidade de Macaé (RJ), onde a renda por habitante chega a extraordinários R$ 96 mil.
Deveríamos supor que, nessa cidade tão privilegiada graças à exploração de petróleo, as pessoas desfrutam de boas chances de prosperar. Errado. Como a mão-de-obra local tem baixa qualificação, os melhores empregos gerados são ocupados por profissionais de outras cidades.
Esse exemplo de pobreza na riqueza faz dali um caso a ser estudado pelos candidatos, nessas eleições, sobre os efeitos do baixo investimento em capital humano.
Com o dinheiro arrecadado com o petróleo, o orçamento do município é de R$ 750 milhões, para uma população de 156 mil habitantes. Para comparar: o orçamento da cidade de São Paulo, a mais rica em valores absolutos do país, é de R$ 14 bilhões para 11 milhões de habitantes.
As escolas públicas de Macaé exibem um desempenho mediano - e mediano no Brasil significa qualidade ruim -, o que explica, em larga medida, por que sua população não consegue se apropriar da riqueza produzida bem à frente de seu nariz.
Não é culpa localizada desse ou daquele prefeito, mas de uma "obra conjunta" que reflete as conseqüências devastadoras da falta de visão sobre a importância de investir na qualificação dos indivíduos. O resultado é o desperdício na abundância e a geração de pobreza na riqueza.
Na semana passada citei nesta coluna o caso de Sertãozinho, cujas escolas públicas estão no topo do Estado de São Paulo, segundo a lista da Prova Brasil, que mede os conhecimentos de matemática e português no ensino fundamental. Uma delas, a José Negri, conseguiu ficar entre as dez melhores de todo o país, gastando R$ 150 mensais por aluno, o que não é muito diferente da média da região Sudeste. Dali saíram campeões em olimpíadas nacionais de física e matemática.
Façamos, então, a comparação devastadora. Com 110 mil pessoas - não muito distante da população de Macaé -, a Prefeitura de Sertãozinho tem um orçamento de R$ 120 milhões, seis vezes menos que o da cidade fluminense.
Desconte-se a favor de Macaé o fato de que, devido ao aumento da exploração do petróleo na bacia de Campos, ocorreu um rápido crescimento populacional, no começo de 1980 - um aumento de três vezes o tamanho de sua população.
Em Sertãozinho, o aumento não foi tão rápido nem tão intenso. Mas, por causa da indústria associada à cana, também passou por um forte tremor: a população dobrou no mesmo período da mudança demográfica de Macaé.
Se Macaé tivesse, porém, uma elite política e empresarial que conhecesse relação entre capital humano e distribuição de renda, saberia que a riqueza está mais dentro da cabeça dos indivíduos que debaixo da terra. Como conseqüência, se investiria mais nas escolas, nos cursos técnicos profissionalizantes, nos programas para a formação de tecnólogos.
Não existe aqui nenhuma novidade. Se prestarmos atenção em cidades brasileiras que estão virando pólos de riqueza, explorando sua vocação, veremos que os arranjos produtivos se uniram a arranjos de conhecimento. São lugares em que o desemprego não está na lista dos maiores problemas. Nesses arranjos produtivos, empresas de jovens empreendedores são incubadas, com a associação da prefeitura com as universidades, articuladas com entidades do tipo Sebrae. Vemos esse tipo de ação em Santa Rita de Sapucaí (MG), na área de telecomunicação; em Birigüi (SP), calçados infantis; Campina Grande (PB), informática.
Nessa aula de incompetência de Macaé há pelo menos duas dicas especialmente valiosas em período eleitoral: 1) quanto mais as cidades se organizarem como comunidades de aprendizagem, mais chance haverá de se produzir riqueza e distribuí-la melhor; 2) quanto mais essa organização partir do nível local - a começar da prefeitura - , maior eficiência se conseguirá.
Se entendemos Macaé, entendemos por que o Brasil, tão rico, consegue gerar tanta pobreza.
P.S. - Estamos cada vez mais dispondo de números sociais para não cairmos nas lorotas dos governantes - isso faz parte dos avanços democráticos. Coloquei em meu site (www.dimenstein.com.br) exemplos de cidades, a partir dos dados educacionais e de renda, para que o eleitor possa fazer as comparações. É aprendendo a cobrar que os serviços públicos tendem a melhorar. Vamos ver que, quanto maior a pressão social, melhor o dinheiro é empregado.
FONTE: Aprendiz - UOL
Resultado: teríamos a cidade de Macaé (RJ), onde a renda por habitante chega a extraordinários R$ 96 mil.
Deveríamos supor que, nessa cidade tão privilegiada graças à exploração de petróleo, as pessoas desfrutam de boas chances de prosperar. Errado. Como a mão-de-obra local tem baixa qualificação, os melhores empregos gerados são ocupados por profissionais de outras cidades.
Esse exemplo de pobreza na riqueza faz dali um caso a ser estudado pelos candidatos, nessas eleições, sobre os efeitos do baixo investimento em capital humano.
Com o dinheiro arrecadado com o petróleo, o orçamento do município é de R$ 750 milhões, para uma população de 156 mil habitantes. Para comparar: o orçamento da cidade de São Paulo, a mais rica em valores absolutos do país, é de R$ 14 bilhões para 11 milhões de habitantes.
As escolas públicas de Macaé exibem um desempenho mediano - e mediano no Brasil significa qualidade ruim -, o que explica, em larga medida, por que sua população não consegue se apropriar da riqueza produzida bem à frente de seu nariz.
Não é culpa localizada desse ou daquele prefeito, mas de uma "obra conjunta" que reflete as conseqüências devastadoras da falta de visão sobre a importância de investir na qualificação dos indivíduos. O resultado é o desperdício na abundância e a geração de pobreza na riqueza.
Na semana passada citei nesta coluna o caso de Sertãozinho, cujas escolas públicas estão no topo do Estado de São Paulo, segundo a lista da Prova Brasil, que mede os conhecimentos de matemática e português no ensino fundamental. Uma delas, a José Negri, conseguiu ficar entre as dez melhores de todo o país, gastando R$ 150 mensais por aluno, o que não é muito diferente da média da região Sudeste. Dali saíram campeões em olimpíadas nacionais de física e matemática.
Façamos, então, a comparação devastadora. Com 110 mil pessoas - não muito distante da população de Macaé -, a Prefeitura de Sertãozinho tem um orçamento de R$ 120 milhões, seis vezes menos que o da cidade fluminense.
Desconte-se a favor de Macaé o fato de que, devido ao aumento da exploração do petróleo na bacia de Campos, ocorreu um rápido crescimento populacional, no começo de 1980 - um aumento de três vezes o tamanho de sua população.
Em Sertãozinho, o aumento não foi tão rápido nem tão intenso. Mas, por causa da indústria associada à cana, também passou por um forte tremor: a população dobrou no mesmo período da mudança demográfica de Macaé.
Se Macaé tivesse, porém, uma elite política e empresarial que conhecesse relação entre capital humano e distribuição de renda, saberia que a riqueza está mais dentro da cabeça dos indivíduos que debaixo da terra. Como conseqüência, se investiria mais nas escolas, nos cursos técnicos profissionalizantes, nos programas para a formação de tecnólogos.
Não existe aqui nenhuma novidade. Se prestarmos atenção em cidades brasileiras que estão virando pólos de riqueza, explorando sua vocação, veremos que os arranjos produtivos se uniram a arranjos de conhecimento. São lugares em que o desemprego não está na lista dos maiores problemas. Nesses arranjos produtivos, empresas de jovens empreendedores são incubadas, com a associação da prefeitura com as universidades, articuladas com entidades do tipo Sebrae. Vemos esse tipo de ação em Santa Rita de Sapucaí (MG), na área de telecomunicação; em Birigüi (SP), calçados infantis; Campina Grande (PB), informática.
Nessa aula de incompetência de Macaé há pelo menos duas dicas especialmente valiosas em período eleitoral: 1) quanto mais as cidades se organizarem como comunidades de aprendizagem, mais chance haverá de se produzir riqueza e distribuí-la melhor; 2) quanto mais essa organização partir do nível local - a começar da prefeitura - , maior eficiência se conseguirá.
Se entendemos Macaé, entendemos por que o Brasil, tão rico, consegue gerar tanta pobreza.
P.S. - Estamos cada vez mais dispondo de números sociais para não cairmos nas lorotas dos governantes - isso faz parte dos avanços democráticos. Coloquei em meu site (www.dimenstein.com.br) exemplos de cidades, a partir dos dados educacionais e de renda, para que o eleitor possa fazer as comparações. É aprendendo a cobrar que os serviços públicos tendem a melhorar. Vamos ver que, quanto maior a pressão social, melhor o dinheiro é empregado.
FONTE: Aprendiz - UOL
Página 1 de 1
Permissões neste sub-fórum
Não podes responder a tópicos
|
|